14º Tabelionato de Notas

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Artigo – A inexigibilidade automática do ITCMD pós-reforma tributária
13 DE AGOSTO DE 2024


Após demasiados anos de espera, sendo ansiosamente aguardada pelo mercado e população em geral, a reforma tributária, enfim, saiu do papel, carregando consigo o objetivo maior de proporcionar um sistema tributário nacional menos complexo e burocrático.

Muito embora focada em simplificar e otimizar a tributação sobre o consumo, a Emenda Constitucional nº 132/2023 — texto legislativo responsável pela mencionada reforma — também alongou seu alcance para tratar da imposição fiscal relativa ao patrimônio, trazendo, nesta seara, importantes mudanças no panorama tributário brasileiro concernentes ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos.

Como se sabe, o ITCMD é tributo estadual, razão pela qual os estados e o Distrito Federal possuem competência plena para legislar, disciplinando sobre sua incidência e normas adjacentes. Há, neste quesito, porém, duas exceções previstas desde os primórdios da Constituição: nos casos em que o doador tiver domicílio ou residência no exterior e em que o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior, os estados e o DF somente poderiam estabelecer internamente a incidência tributária do ITCMD após a edição de lei complementar nacional a seu respeito.

Caso esteja se questionando, sim, esta lei de caráter nacional nunca foi promulgada, o que motivou diversos estados a instituírem o ITCMD nas hipóteses acima independentemente da previsão constitucional, culminando, é claro, em rigorosa resistência dos contribuintes e, consequentemente, em extenso debate no âmbito do Poder Judiciário.

Repercussão Geral

A discussão atingiu o palanque do Supremo Tribunal Federal (STF), que, em sede de Repercussão Geral (Tema nº 825 — RE nº 851.108/SP), ratificou a regra do Texto Maior condicionando a validade de incidência do ITCMD nas mencionadas situações à prévia edição de lei complementar regulamentando a temática.

Aliás, mantendo a coerência do então decidido, a Suprema Corte acolheu numerosas ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) propostas pela Procuradoria-Geral da República com o intuito de obstar a continuidade da ilegítima cobrança, tendo sido decretada a inconstitucionalidade formal de diversas leis estaduais no que se referiam à incidência do ITCMD sobre transferências patrimoniais — via sucessão ou doação — oriundas do exterior.

Nessa conjuntura, paralelamente à determinação de junho de 2022 do STF fixando o prazo de 12 meses para o Congresso Nacional editar lei complementar externando normas gerais sobre o assunto, sobreveio a já citada EC 132/2023, publicada no último decêndio do ano passado, explicitando os estados competentes para exigir o ITCMD sobre doações e sucessões advindas do exterior enquanto não promulgada a lei complementar versando acerca da matéria.

Em outros termos, autorizou-se os estados a instituírem o ITCMD nas hipóteses com elemento de conexão com o exterior enquanto não for publicada lei complementar. Contudo, a questão que paira é: a alteração constitucional propiciada pela EC 132/2023 é suficiente para legitimar a cobrança do ITCMD com base nas leis estaduais atualmente vigentes? A resposta, para nós, é de que não.

Apesar de, a partir de 21 de dezembro de 2023, a Constituição permitir expressamente que os estados tributem doações e heranças vindas do exterior, fato é que os dispositivos das leis estaduais ora vigentes que preveem a referida incidência foram declarados inconstitucionais pelo STF no julgamento do RE nº 851.108/SP, eis que carecedores de fundamento de validade (no caso, lei complementar prévia reguladora da matéria).

E mais: nem mesmo a sobrevinda da EC 132/2023 autorizando a cobrança antes de lei nacional disciplinadora tem o condão de reviver as citadas normas das leis estaduais, ainda que estejam em consonância e não ofereçam conflito material com a nova norma constitucional. Isto, pois o ordenamento jurídico pátrio não admite o fenômeno da constitucionalidade superveniente, entendimento inclusive pacificado pela jurisprudência do STF, para que determinado “ato normativo, que nasceu inconstitucional, deve ser considerado nulo perante a norma constitucional que vigorava à época de sua edição”.

Significa dizer que uma norma declarada inconstitucional por ausência de respaldo no sistema jurídico não passa a ser considerada constitucional se houver, posteriormente à sua introdução no ordenamento, a edição de dispositivo que traria a ela fundamento de validade. Este foi, ademais, o exato posicionamento defendido pelo STF quando julgou inconstitucional o artigo 3º, §1º, da Lei nº 9.718/1998, que intentou o alargamento da base de cálculo do PIS e da Cofins sem autorização constitucional, ainda que tenha, depois, sobrevindo a EC 20/1998 ampliando a hipótese de incidência destas contribuições para possibilitar o atingimento, também, da receita bruta.

Desta forma, é inviável sustentar, com o advento da EC 132/2023, o ressurgimento automático da eficácia das leis estaduais a ela pretéritas que estabeleciam a tributação do ITCMD sobre doações e heranças com elemento de conexão com o exterior. Para que sejam válidas as cobranças relativas a essas situações, devem os Estados, respeitando-se os princípios da segurança jurídica e legalidade tributária, editarem novas leis internas objetivando onerar as referidas transferências patrimoniais, pois, apenas neste caso, é que as exigências teriam respaldo constitucional.

Felipe Wagner de Lima Dias é advogado, mestrando e pós-graduado pela Faculdade de Direito da FGV-SP, membro do Núcleo de Direito Tributário da mesma instituição e ex-coordenador do Grupo de Direito Tributário da Câmara-e.net.

Gustavo Molina é advogado da área tributária do Arbach e Farhat Advogados, especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e autor de artigos em obras coletivas e em revistas especializadas em matéria tributária.

Fonte: Conjur

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